| 0 comentários ]


As paredes da Biblioteca Central d@s Estudantes ostentam imagens propagandeando o genocídio. A bandeira do Estado de Israel está hasteada no centro do prédio que abriga o “saber acadêmico”. Poderíamos interpretar estas fotografias de inúmeras formas. Da maneira como querem os seus expositores ao escolher justo a universidade, colocando no final a propaganda de uma empresa aérea israelense. Ou da maneira que está dita, de forma chocante, na contraposição das imagens de crianças loiras brincando na praia com as imagens de soldados armados, evidenciando a óbvia propaganda militarista que está exposta. Esta exposição está sendo financiada pela Fundação Jacobi (ou Jacobi Foundation) que é o braço beneficente da Jacobi Capital Corporation, uma obscura empresa que capta recursos para empreendimentos imobiliários no Leste Europeu e em Israel. Uma das missões desta empresa é justamente difundir a história de Israel, por meio de exposições. Muitas vezes, ao se falar contra o Estado de Israel, o discurso é entendido como sendo anti-semita. Muito importante, no entanto, que não se faça esta confusão. Trata-se de repúdio a uma política sistemática de Estado de invasão de territórios palestinos e genocídio em massa daquele povo. Atos dessa gravidade e, particularmente, por serem conduzidos por um ator reconhecido de relações internacionais, não podem passar despercebidos. A exposição da BCE fabrica justamente isto: invisibiliza o terror de Estado e dá um tom pacífico e acolhedor da “terra santa”. Tom que é demonstrado na maioria das fotos apesar de seu caráter militarista. Casal de militares se beijando, grupo de pessoas judeu-africanas sendo acolhidas, danças, praias, um Yasser Arafat de cara contente dando um tom de diálogo e avanços na questão palestina, a tristeza de pessoas israelenses sendo despejadas de suas casas, bandeiras e mais bandeiras de Israel. Estas são facetas que fazem parte, não só de Israel como do Oriente Médio de uma maneira mais ampla. Assim, trazer esta exposição é negligenciar que se trata de uma das regiões mais conflituosas do planeta e que o Estado de Israel tem sido mais digno de boicotes que de iniciativas que o propagandeiem. Não esqueçamos que a pressão internacional foi fato de extrema importância para o fim (pelo menos oficialmente) do Apartheid na África do Sul. Nós, estudantes, funcionárias(os) e professoras(es) nos sentimos profundamente agredidas e agredidos por este acordo entre a Universidade de Brasília e a embaixada de Israel. A nossa ofensa é proporcional ao número de mortes provocadas pelo Estado Israelense, que vem sistematicamente comprando a mídia mundial ao seu favor. Nossa universidade, que recentemente passou por um processo de democratização, não pode ser palco para propagandear o militarizado Estado de Israel e o conseqüente genocídio do povo palestino. Uma paz que seja verdadeiramente justa não se separa da luta pelo direito ao retorno de todos os refugiados às cidades e às aldeias das quais foram expulsos desde 1948. Direito inalienável que se choca com a existência de um estado fundado a partir de critérios religiosos ou “étnicos”. Uma exposição mais honesta e comprometida com a realidade de Israel deve ter espaço para tratar sobre a questão palestina e sem medo de colocar a condição de terror e perseguição por parte daquele Estado. Nesse sentido, além de trazer nosso repúdio ao espaço extremamente parcial e enviesando cedido à esta exposição, viemos também solicitar um espaço de contraponto. Um direito de resposta, por assim dizer, capaz de dar voz a uma outra faceta israelense que não pode ser ignorada. Com esta carta, pautamos o direito de resposta institucional, promovendo uma semana de visibilidade palestina com vídeos, exposição de fotos, festival de culinária e mesa redonda com pessoas estudiosas do assunto e com o grupo de refugiados da palestina que se encontra em Brasília. A programação destes eventos será concluída em breve e encaminhada para a reitoria. Contato: unbpalestina@gmail.com

| 0 comentários ]

(Em março de 2002, uma delegação do Parlamento Internacional dos Escritores fez uma viagem pelos territórios palestinos. O grupo era composto por Bei Dao (China), Breyten Breytenbach (África do Sul), Christian Salmon (França), Vincenzo Consolo (Itália), Wole Soyinka (Nigéria), Juan Goytisolo (Espanha), Russel Banks (EUA) e José Saramago (Portugal). Em sua recepção aos colegas, o poeta palestino Mahmoud Darwish pronunciou o discurso abaixo)

Mahmoud Darwish

Ramallah, 25 de março de 2002

É para mim um grande prazer e uma honra recebê-los nesta terra em sua primavera sangrenta, esta terra que tem saudade de seu antigo nome: terra de amor e de paz.

A visita corajosa de vocês durante este cerco monstruoso é uma forma de vencê-lo. A presença de vocês aqui interrompe nosso sentimento de isolamento. Com essa presença, percebemos que a consciência internacional, da qual vocês são honrados representantes, está viva, é capaz de protestar e de tomar partido da justiça. Vocês nos deram a certeza de que os escritores ainda têm um papel importante na luta pela liberdade e no combate ao racismo.

A responsabilidade pelo destino humano não pode limitar sua expressão ao texto literário. Em situações de urgência e calamidade humana, o escritor parte à procura de um papel moral em outras formas de ação pública, um papel que reforça sua integridade literária, que mobiliza a consciência pública para valores morais elevados, dos quais o mais importante é a liberdade. É dessa forma que entendemos a mensagem que vocês nos enviam hoje: uma mensagem de solidariedade e simpatia.

Sei que mestres das palavras não carecem de retórica diante da eloqüência do sangue. Por isso, nossas palavras serão tão simples quanto nosso direito: nascemos nesta terra e desta terra. Não conhecemos outra mãe, não conhecemos outra língua materna senão a sua. E, quando compreendemos que ela porta em si histórias demais e profetas em demasia, compreendemos que o pluralismo é um espaço que abraça de maneira ampla, e não uma cela de prisão, que ninguém tem o monopólio de uma terra, de Deus, da memória. Sabemos, também, que a história não pode se vangloriar nem de equidade nem de elegância. Nossa tarefa, contudo, como seres humanos, é humanizar esta história da qual somos simultaneamente vitimas e produtos.

Não há nada mais evidente que a verdade palestina e a legitimidade palestina: esta terra é nossa e esta pequena parte é uma parte de nossa terra natal, uma terra natal real e não mítica. Esta ocupação é uma ocupação estrangeira que não escapa à acepção universal da palavra ocupação, sejam quais forem os títulos de direito divino que ela cita; Deus não é uma propriedade pessoal de ninguém.

Aceitamos as soluções políticas fundadas numa partilha da vida nesta terra, no contexto de dois Estados para dois povos. Não exigimos senão nosso direito a uma vida normal, dentro das fronteiras de um Estado palestino, na terra ocupada desde 1967, incluindo Jerusalém Oriental, nosso direito a uma solução justa do problema dos refugiados, ao fim da instalação de colônias. É a única via realista para a paz que encerrará o círculo vicioso deste banho de sangue.

A situação atual é de uma evidência gritante, não se trata de uma luta entre duas existências, como quer o governo israelense: eles ou nós. A questão é acabar com a ocupação. A resistência à ocupação não é somente um direito. É um dever humano e nacional que nos faz passar da escravidão à liberdade. O caminho mais curto para evitar outros desastres e chegar à paz é libertar os palestinos da ocupação e libertar a sociedade israelense da ilusão de um controle exercido sobre outro povo.

A ocupação não se limita a nos privar das condições elementares de liberdade, ela nos priva até mesmo do essencial de uma vida humana digna, declarando a guerra permanente a nossos corpos, nossos sonhos, às pessoas, às casas, às árvores, cometendo crimes de guerra. Ela não nos promete nada melhor a não ser o apartheid e a capacidade da espada de vencer a alma.

Mas nós sofremos de um mal incurável que se chama esperança. Esperança de libertação e de independência. Esperança de uma vida normal, na qual não seremos nem heróis nem vítimas. Esperança de ver nossas crianças irem à escola sem riscos. Para uma mulher grávida, esperança de dar à luz um bebê vivo, num hospital, e não uma criança morta diante de um posto de controle militar. Esperança de que nossos poetas verão a beleza da cor vermelha nas rosas e não no sangue. Esperança de que esta terra reencontrará seu nome original: terra de amor e de paz. Obrigado por carregar conosco o fardo dessa esperança.

teste

Watch videos at Vodpod and more of my videos